Pesquisar neste blogue

sábado, 24 de dezembro de 2016

Círculos Discêntricos

É véspera de Natal. O mundo cristão rejubila esta noite com a comemoração do nascimento do menino-Deus. Ocorre-me o extracto de um poema de Natal de Miguel Torga ( cito de memória):  Leio o teu nome nas páginas da noite, menino Deus, e fico a meditar no milagre  dobrado de seres Deus e menino. Em Deus não acredito. Mas de ti, como posso duvidar? Todos os dias nascem meninos pobres em currais de gado; humanas alvoradas; a divindade é o menos. A luz de esperança que o nascimento de cada criança traz ao mundo deveria fazer-nos esquecer tudo o que mau vai acontecendo nesse mesmo mundo. A um ritmo que abala a mais forte esperança. Retido em casa por uma gripe agreste, tenho lido muitos jornais esta semana. Também por isso é inevitável cotejar o júbilo e o chamamento do amor desta quadra, com o ódio de tantos acontecimentos recentes. Fiquemo-nos pela Europa: mais um atentado utilizando um camião num mercado de Berlim, com mais de uma dezena de mortos e várias dezenas de feridos. Quase em simultâneo, um polícia ou ex-polícia baleou o embaixador russo em Ancara, Na complexa questão dos refugiados, a Turquia é, como se sabe, uma das principais portas de entrada na Europa. Que deixou de ter estadistas. O problema dos refugiados e outros, muitos outros com que se depara, resultam da cegueira medíocre de quem a governa. É hoje claro para toda a gente informada que a questão dos refugiados deveria ter sido encarada e resolvida na origem. Prevendo a castástrofe social da reconhecida incapacidade de acolhimento de todos aqueles que, por legítimo anseio, a procuram como refúgio ou recomeço de vida. Como não foi prevenida, é louvável que se tenha tentado mitigar o sismo social daí resultante com medidas humanamente imprecindíveis. Destaco eu e quase todos - hoje - a atitude de Angela Merkel neste caso. -( Alguns esquerdistas personificaram na Chanceler o diabo das austeridades troikianas; calados que nem ratos com a generosidade das suas propostas para os refugiados, claro está.)- Por isso, mais ignóbil ainda é - se este "mais" fosse possível - o atentado de Berlim. Como ignóbil é todo o acto de terror. A Europa e o mundo estão numa encruzilhada das mais difíceis dos últimos séculos. A Europa (UE) gizada por um punhado de estadistas de grande nível logo a seguir à II Grande Guerra, não conseguiu evoluir harmoniosamente. Escusamos de esconder a cabeça debaixo da areia. A burocracia insaciável devorou-lhe os ideais. Tem de ser repensada. Reconstruída com fundamentos que incorporem as novas realidades. Haverá gente capaz de "sonhar" uma nova União Europeia? Tenho para mim que a indecisão dificulta e estreita as opções. Há uns dois anos entendia que poderia haver duas soluções: (i) mais integração; (ii) pausa, provável recuo e criatividade para recomeçar. Os últimos acontecimentos, designadamente o chamado Brexit tornou muito improvável caminhar agora e sem mais para uma maior  integração. Por outro lado, tenhamos consciência: para o bem ou para o mal, a UE jamais será a mesma sem o Reino Unido.
Este informal e superficial "rebusco de imprensa"  tem de fazer uma alusão, por pequena que seja, aos escândalos internos. O último é o caso dos negócios do plasma. Já haviam sido ventilados. Agora, as novas "aproximações" resultam de uma investigação oficial. O ex-presidente do INEM e da Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo ( Ribeiro e Cunha) terá facultado à Octafarma de Lalanda e Castro negócios chorudos com o plasma importando, enquanto o sangue de milhares ou centenas de milhares de dadores nacionais era desperdiçado. Enfim, deixemos que a investigação prossiga para que não vá a lado algum,  com alguma probabilidade. Em termos de corrupção, cada sachada é sua minhoca. Impressiona. Impressiona ainda mais pelo facto de ser sempre um punhado de nomes que vem á tona. Lalanda foi o patrão do Sócrates. Verdadeiro? Quem acredita? O Sócrates vendia casas, suas e da mãe, ao amigo Santos Silva. Agora sabemos que a Octafarma fez o mesmo ao Senhor Luís Ribeiro e Cunha. No Porto, no Algarve, em Lisboa (?). Afinal, Ribeiro e Cunha era vizinho de Sócrates no Heron Castilho. Tudo isto desafia os mais crédulos. Lalanda e Castro também estará nos vistos gold e em alguns outros processos na companhia do Senhor Bataglia e de vários outros altos responsáveis angolanos. Mesmo para quem desconhece os processos, mas está minimamente atento ao que o rodeia, parece que há alguns grupos ligados ao poder que se "entreteve" durante anos e anos a construir caleiras sumidouras para os dinheiros públicos. Nenhum País pode resistir a tanto. E as corporações são mais e mais acintosas na defesa de privilégios apesar do miserável empobrecimento gradual do País produtivo.
Enfim, a esperança que envolve a época natalícia, tem de suplantar a miséria moral que vai corrompendo as sociedades. Os sistemas de conformação social perderam toda a sua eficácia secular. A própria lei é tomada muitas vezes como um mero faz de conta. Porque o Legislador também perdeu a tramontana. Deixou de nortear-se pelo bem comum. Tantas vezes inúteis ou escusadas, há leis motivadas apenas por objectivos suspeitos: beneficiar apaniguados. Que justificação poderá haver para isentar os Partidos Políticos do IMI, quando se legisla criando uma sobretaxa para prédios com valores acima de €600.000,00 ? O despudor é muito grande. Por muito pesadas que consigam ser, as palavras já não são suficientes para demover esta traça maldita que nos vai corroendo a esperança.