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domingo, 31 de julho de 2011

Mamulengo

No Brasil, o Mamulengo brinca-se. Os mestres, contra-mestres e folgazões brincam o mamulengo numa interacção permenente e normalmente longa com o público nos Estados do Nordeste e particularmente em Pernambuco. Há personagens típicas, naturalmente, como o Simão, o Tiridá, o malandro do João Redondo e até a Quitéria, a Chica da Fubá. Isto para as personagens humanas mais conhecidas e populares. Mas também há a Morte, o Diabo, etc.  indispensáveis à dimensão fantástica e transcendente de todo o teatro de bonecos. E há os animais, como a Cobra e o Boi - os mais comuns-. A semelhança com os Robertos portugueses designadamente com os Bonecos de Santo Aleixo tem sido estudada designadamente pela gente do CENDREV, como pode ver-se em Teatro de Marionetas, de 2002, edição coordenada por Christine Zurbach. Há termos tão interessantes como bincar, folgança e outros que nos lembram de imediato os folguedos ibéricos, logo a sua origem e a  colonização portuguesa. Sendo este teatro de bonecos brasileiro e nordestino, a música e a dança teriam sempre de desempenhar um papel primordial. Por isso há os instrumentistas que tocam o fole de oito baixos, o triângulo, o ganzá, o zabumba. Curioso é o intermediário Mateus que faz a ponte entre o Meste, o Contra-mestre e o público nos espectáculos que, por vezes, se prolongam até  madrugada nos sítios de Pernambuco onde é montada a empanada, a barraca ou tenda. Espectáculo iminentemente popular e "descamisado" a burguesia urbana só por curiosidade folclórica a ele assitiria. No Brasil, como cá. Folgança de quem nada tem a perder, oxalá o Brasil e nós todos consigamos preservar a sua autenticidade, como resistência àquilo que já foi chamada de diversão enlatada  servida abundantemente pela televisão, e não só, e muito eficaz nas lavagens ao cérebro e correspondentes alienações neste teatro da vida onde já nada conseguimos encontrar de fantástico. Por isso, as marionetas enlatadas e manipuladas por cucos matreiros são desinteressantes objectos de mediocridade. Condicionam a vida de todos nós. Mas nunca serão personagens vividas pelos Mestres Luiz da Serra, Zé de Vina ou António Biló que brincam o Mamulengo para matar o vício.

sábado, 30 de julho de 2011

Bunraku

O Teatro de marionetas no Japão, conhecido como BUNRAKU é caso único em todo o mundo. Associa a destreza, habilidade a arte das marionetas à recitação e á música. Por estas e múltiplas outras razões, a Unesco reconheceu o Bunraku  como património cultural da humanidade em 2008. A música é tocada numa espécie de banjo de 3 cordas ( o shamisen). As marionetas ( nyngio) são de grande dimensão. Mas não é só por isto que são precisos 3 puppeteers para actuar uma marioneta. A razão está sobretudo na destreza e na capacidade artística que o Bunraku exige. O principal bonecreiro ( omo-zukai) trabalha apenas a cabeça e a mão direita da marioneta. O hidari-zukai trabalha a mão esquerda. O ashi-zukai trabalha as pernas e pés. Diz-se que são precisos 10 anos para progredir dos pés para a mão esquerda e mais 10 desta para a cabeça. Enfim: sabedoria oriental. As marinetas ocidentais são muito mais precoces, hoje em dia. ( Provavelmente sucede o mesmo com as orientais). E os marionetistas surgem muitas vezes do nada...ao cantar dos cucos...e não só. Mas o melodioso cantar dos cucos é seguramente uma música em que deixam enredar-se com o gosto que todos os oportunistas põem na sua especial sagacidade!



domingo, 24 de julho de 2011

Kaspertheater

Kasper, também conhecido pelos diminutivos Kasperl ou Kasperle, é o primo alemão de Punch, pulcinello,etc., como já mencionámos. Parece que a origem do nome se deverá ao rei mago Gaspar. Mas Kaspar Laifari foi uma personagem do bonecreiro Graf Pocci de 1858. Como também já referimos há sempre antecedentes e procedentes, nestas coisas de marionetas, como em tudo na vida. Hans Wurst ( Zé Salsicha ?) seria já uma figura de marioneta na Alemanha, antes do aparecimento de Kasper. Actualmente e desde 1920, o novo Kasper, dito de Hohensteiner é uma recriação do grande bonecreiro Max Jacob. Há uma espécie de adágio popular na Alemanha para designar os debates parlamentares ( mesmo os dos estados e municípios) longos, maçudos e improdutivos. Chamam-lhe Kaspertheater ( teatro de marionetas). E há quem não reconheça sentido de humor aos Alemães! Bom, lá marinetas são grande parte dos nossos parlamentares, isso é verdade. Marionetas de cordel ou de fios, com frequência. Os mais chegados ao poder são marionetas de luva, reconhecidamente. Mas a grande maioria não passa de marionetas de sombras. Vêm e vão e ninguém dá por isso. É difícil memorizar sombras. Mas subsídios de reitegração, além de todas as conhecidas sinecuras, lá isso têm. Enfim, o nosso parlamento é, de facto, um Kaspertheater. Mas o nome mais cáustico e menos polido pelo qual também é conhecido, entre nós, não lhe assenta mal: feira da ladra.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

D. Roberto

 D. Roberto; retirado de www.samarionetas.com 
D. Roberto é o parente português das figuras populares de marionetas ocidentais com origem no Pulcinella Italiano. Todos os parentes europeus que mencionámos anteriormente têm uma fisionomia semelhante, por exemplo, um nariz longo e rubicundo. O D. Roberto português, pelo contrário, não tem uma fisionomia típica. Talvez por isso ele tenha dado origem ao nome pelo qual também ficou conhecida esta forma de teatro: teatro de marionetas, de fantoches ou teatro de robertos, entre outras designações. Em Portugal, as figuras de fantoches e especialmente os robertos emitiam (!) e emitem um som proveniente da utililização pelos bonecreiros de uma palheta. Este instrumento, de difícil maneio, era e é importantíssimo na sincronização de sons, movimentos e gestos dos bonecos. Por não ter uma fisionomia típica, o D. Roberto é um verdadeiro vira casacas. Como bom português! O uso e também abuso da palheta faz deste boneco um palrador. Tão ao gosto nacional que não vale a pena sequer enumerar os políticos muito bons em palheta, mas completamente medíocres e até incompetentes no conhecimento e na acção. Políticos e não só. Mas, ainda assim, até para justificar a sua incompetência, conseguem iludir muita gente durante muito tempo. Palras bem e enganas muita gente. Sobretudo aqueles que querem ser enganados. A peça é recorrente. Daí a situação do País. Também recorrente, aliás. Vale a pena referir que o Mestre António Dias foi um dos últimos bonecreiros nacionais e que  o grupo de Alcobaça S.A. Marionetas é depositário dos conhecimentos inestimáveis do Mestre António Dias. É costume associar a origem do nome D. Roberto a uma de duas fontes: à peça Roberto do Diabo, que teria sido inspirada no Duque da Normandia, ou ao empresário de teatro Roberto Xavier de Matos. Pouco importa. Que o teatro de Robertos tenha uma longa vida, porque é fascinante. Até para poderem denunciar os tristes vira casacas nacionais que, como trepadeiras insidiosas, de tudo se aproveitam para subir na vida, sem esforço e sem necessidade de mérito. Basta o tráfego de influências, enredo no qual somos verdadeiramente imbatíveis.

domingo, 10 de julho de 2011

Marionetas, enfim: um começo

Os espectáculos de marionetas são teatro. E o teatro é comunicação. Todas as formas de arte são comunicação elaborada, crítica, relacional. A palavra inglesa puppet ( de popet pelo alemão poppe) terá origem no sânscrito putrika, puttalika. Marioneta é do Francês mais recente. Mas pode procurar-se a origem semântica em poupette, diminutivo de poupée. No latim pupa ou pupula têm o mesmo sentido: boneca, filha, menina, little girl. A imagem que reproduzimos é do Egipto, muito anterior à era cristã. São anões dançarinos, movidos a fios ou cordas. São marionetas de fios encontradas em Lisht, nas escavações de 1936. No espectáculo de marionetas, o actor, manipulador, realizador, produtor,( todos num só, em regra) esconde-se atrás da sua criação e, por isso, pode ser mais sarcástico, mais irónico e até violento. Também por isso, a criatura ( boneco, sombra, avatar) é o instrumento material da representação. Não será em vão que as marionetas mais populares ( Mr. Punch, D. Roberto, Polichinelle, Pulchinella, Petrouska, Casper, Kasperl, Hans Wurst, Yan Klaassen, Karaghiosis, karagoz, Guinhol, etc.) têm e sempre tiveram um lado violento, ainda que para protecção dos mais desfavorecidos, como é tradição literária. Abordaremos algumas destas personagens, seguramente.

* A imagem foi retirada da obra de Keith Rawlings, Observations on the historical development of puppetry, que seguimos de perto.

Regresso aos Cucos

Inevitável regresso aos Cucos. Diz o semanário expresso que o Presidente da Câmara de Loures emprega, na autarquia, nada mais nada menos, do que 5 familiares: mulher, filha, dois cunhados e nora ou futura nora, -não se entende bem-. Mas, como o de Grândola, diz  que nada lhe pesa na consciência.  Obviamente. Se esta gente tivesse consciência, o País seria um local asseado e decente, onde se poderia viver. É outro socialista. Mera coincidência! O Rato é apenas uma referência e um dos lugares geométricos da enorme agência de empregos em que os partidos se transformaram.
Todos eles. Particularmente aqueles que já ocuparam o poder. Central, regional e local. Ocuparam o poder, é este o termo, de facto. A impunidade já não tem qualquer tipo de explicação. Teremos chegado ao ponto em que só pode pensar-se e dizer-se quanto pior melhor. Claro que somos todos a sofrer as consequências. Mas não seria desejável - em abstracto e só em abstracto - que não houvesse dinheiro para pagar este triste abocanhar dos recursos escassos de um país pobre com uma população já resignada a tanta pouca vergonha?  Ah! Os Cucos! Maravilhosa historieta desta democracia sobrevoando um palco de marionetas num silêncio envergonhado. Que pena.
  

sábado, 9 de julho de 2011

Murdoch e as marionetas de fio

O cartoon é hoje 1ª página do Jornal Público. A minha homenagem ao autor. Vem na sequência do encerramento do Jornal News of the world, em virtude das escutas ilegais, dizendo que Cameron teria ordenado a realização de um inquèrito.
Ocorre-me que também os Políticos portugueses - muitos dos que nos têm governado nas últimas décadas- deveriam ser cartaz de um anunciado espectáculo de marionetas. Murdoch poderia ser substituído por muita gente. Também dos meios de comunicação. Mas, em 1º lugar, o "espírito santo de orelha" sussurra-me que indicado deveras seria um figurão da Banca. Por razões que o dinheiro bem conhece, tudo o que tem acontecido a Portugal parece ter sido inspirado nos interesses desse figurão. Porque será que o jornalismo português, e até os bons cartoonistas que temos e sempre tivemos, - mesmo no tempo do Estado Novo- têm bem mais inspiração para acontecimentos e personagens internacionais do que para o que se passa na paróquia?
É certo que muito do nosso jornalismo é mau, pouco corajoso, culturalmente medíocre para não destoar, e vive das migalhas do poder. São fenómenos notórios que se manifestam com alguma subtileza em todos os momentos e com clareza em época de eleições e que explicam, porventura, a razão pela qual as sondagens dão sempre - nos últimos tempos - melhores resultados ao partido no poder do que aqueles que acaba por alcançar. Mas os inquiridos também terão alguma reserva mental. Tudo em sintonia, afinal, com os brandos costumes nacionais. Ainda que haja más "notações" dos ridículos economistas de todas as Moody's. Afinal, ridículos mesmo são todos aqueles que reagem em função dessas avaliações. Ou melhor: ridículo é um mundo dirigido por palpites vertidos em patéticas sequências alfanuméricas. É tudo tão precário que custa a acreditar. Precário e feio o caminho que teimamos em percorrer. 
 Até quando? Assustador é pensar que não haverá regresso.

                                   

terça-feira, 5 de julho de 2011

Ternura rafeira

No passado dia 16 de Junho, a rafeira Diana, ainda adolescente - com menos de um ano - pariu 7 cachorros, na Quinta dos Olhos d'Água, debaixo de uma sebe. Dois morreram pouco tempo após o parto. Restam 5, com aspecto gordo e saudável. Começam a mexer-se e já procuram ração, além da teta da mãe.
São filhos de adolescente, como disse, e de uma relação incestuosa, visto que o pai é o irmão da Diana, de seu nome Maltês. Trata-se de um belo exemplar de rafeiro alentejano. Na fotografia, vê-se o focinho do Manolo ( único com nome e também o mais atrevido), e o irmão cinzento e branco está de rabo.
Uma vez mais o campo proporciona momentos de reflexão. Vale a pena ponderar a força e a capacidade do instinto animal, enquanto componentes essenciais da natureza. A cadela é assustadiça e, por isso ou por algo mais, acaba por ter comportamentos tolos. Só nos foi dada, em estado faminto e maltratada, um mês depois do Maltês. Recuperou, mas ainda hoje pesa metade do irmão ou pouco mais. Todavia, desde que pariu, não permite que o irmão se aproxime dos canitos. O cão morde-a, o que também não é comum, ao que julgo. Ainda assim, o cão respeita o seu instinto maternal e não se aproxima dos filhos/sobrinhos. Por enquanto.
Esta protecção firme das crias em detrimento do macho, ainda que pai, já acontecera na Quinta, quando uma égua pariu. A protecção era tal que chegava a ser agressiva para o macho. Tudo isto ou quase tudo é transportável para o ser humano, provavelmente. Por muito cruel que pareça.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Europa e Estado-Providência:notas esquemáticas

De tempos a tempos, leio agora e oiço considerações muito críticas sobre a Europa e até- imagine-se - sobre o grande motivo de orgulho europeu, após os anos 40: o Estado Social. Há décadas que, em França, mas não só, se previu o fim do Estado-Providência, pela sua insustentabilidade. Mas enfim, a difusão de ideias leva o seu tempo. A insustentabilidade do Estado-Providência, tal como aquele que foi levianamente criado na Europa, não reside tanto no desperdício de meios, mas sim na mentalidade simplista, reducionista, resignada que criou ou ajudou a criar em grande parte da população. Mesmo com a crise gravíssima que vivemos e com taxas de desemprego próximas do absurdo, é comum vermos ofertas de emprego em lojas e que ninguém aceita: ou porque tem de se trabalhar ao fim de semana, ou porque o desempregado, com o valor do subsídio e uns biscates 3 ou 4 vezes por mês acaba por auferir mais do que se tivesse num emprego permanente. Enfim, o Estado- Providência criou os mecanismos naturais de um certo parasitismo que agora passou a ser "moda" denunciar. Só agora!
Revejo, num relance, a história política europeia posterior à segunda Guerra mundial. Detenho-me em momentos chave que levaram à gordura mórbida do Estado Social. Sim, porque todos concordamos com algum apoio público para quem precisa. Ver as pensões de miséria existentes em Portugal e  compará-las com os apoios escandalosos e subsídios à preguiça a jovens de quem deveríamos esperar trabalho, dinamismo e até alguma rebelião, é chocante. Mas, o que se passou em Portugal e talvez um pouco em todos os PIIGS, é deveras espantoso. Conseguiram ultrapassar em poucas décadas, em desperdício, ineficácia e leviandade, todos os outros Estados Europeus. Quem foi tão incompetente? Quem foi tâo irresponsável? Todos os partidos, um pouco. Mas que a memória me traz um gosto a azedo de muito pretenso e arrogante socialismo - ou falso socialismo - é indiscutível.